Carnaval – Parte 1
As origens cristãs do carnaval – O carnaval é cristão?
Você sabia que o carnaval, como data, é uma festa cristã? Vamos conhecer as origens do carnaval!
O mundo, em diferentes lugares, em diferentes épocas, conhece a folia e a festa como um processo que não necessariamente está ligada ao carnaval. O fim de um campeonato, para o time vencedor, por exemplo, é uma forma de folia, assim como vencer uma copa do mundo para um país. Grandes festas aconteciam na Antiguidade, na Idade Média, em diferentes partes do Globo. Existem até hoje, com outros nomes.
No entanto, as origens do carnaval enquanto data, no formato que temos hoje, são vinculadas a uma criação cristã. Que recebe diversas influências e se desenvolve de diferentes maneiras ao redor do mundo, mas que se estabeleceu por conta da cristandade. Vamos descobrir como?
Teoria da folia nas origens do carnaval
Um estudioso chamado Bakhtin, ao pesquisar a obra de um escritor francês do século XVI chamado Rabelais, vai trabalhar com a ideia de carnavalização. A obra desse francês do século XVI, o Rabelais, é cheia de histórias estranhas, divertidas e grotescas, aventuras exageradas com personagens amalucados em que nada acontece dentro daquilo que esperamos. Essas histórias antigas, que dialogam com o imaginário popular, fazem o pesquisador russo, o Bakhtin, traçar um paralelo entre a cultura popular dessas obras analisadas e a cultura oficial representada pelo Estado e pela igreja da época.
A esse popular ele chamou de “carnavalização”. A carnavalização não está presente somente na época, na data do carnaval, mas também em outras ocasiões. A carnavalização, que está presente em tudo que é popular, contém o carnaval, o carnaval enquanto data está contido nela. Por isso, no linguajar popular, é tão comum falar que “tal coisa virou um carnaval”. Mas essa ideia de popular, de exagero e de festejo vai além do carnaval calendário, embora esteja presente nele também.
Carnavalizações antes do carnaval – Festas do Mundo Antigo
Embora as origens do carnaval não estejam nestas festas, vemos aqui algumas influências e similaridades com a festa que conhecemos.
Festa de Ísis

Chamada de Navigium Isidis (o barco de Ísis) ou ploiaphesia (Festa do Barco Lançado), era uma festa em homenagem à deusa Ísis, a deusa da magia. A festa não se apresentava como um festival de luxúria, no entanto, era marcada por atos piedosos. Tal e qual descrito no livro “O asno de ouro”, por Apuleio, uma multidão enchia as ruas da cidade desde o início da manhã para assistir ou participar. Depois vinham os sacerdotes e os músicos, e o povo ia se juntando. Seguia-se a procissão, com maquetes de navios incorporados a charretes, e o objetivo era levar esses pequenos barcos até a praia. Há uma semelhança da estrutura dos barcos que eram puxados pelas charretes e os carros alegóricos das escolas de samba.
Boi Ápis

A festa do boi Ápis era celebrada à beira do Rio Nilo, séculos antes do cristianismo sequer existir, e consistia numa procissão na qual a
principal figura era de um touro enfeitado. Seus chifres eram pintados, seu corpo envolto em fitas coloridas e coberto por tecidos. Ele percorria as ruas da cidade, com uma criança em cima, e sendo seguido por grupos de fantasiados e mascarados. A festa durava sete dias, com muitos banquetes e danças, além de vários tipos de divertimentos. O boi Ápis, associado ao deus Ptah, representava a fecundidade e a força vital da natureza.
Bacchanalia, Festa de Dionísio ou a Festa do Vinho
Dionísio ou Baco era o deus grego do vinho, do teatro e dos prazeres. Na ocasião da colheita das uvas, acontecia a festa chamada de Bacanal (festa do deus Baco), que consistia em banquetes, procissão, música e muitas atividades e em que a sexualidade estava muito presente. A priori acontecia apenas entre as mulheres, as bacantes, as sacerdotisas de Baco ou Dionísio. No entanto, depois, os homens foram admitidos.
As origens do carnaval, enfim!
O carnaval, como dito, é uma festividade cristã. Começa quando, em 604, o papa Gregório I resolve que, durante um período do ano, os fiéis deveriam dedicar-se apenas às questões espirituais. Isso duraria 40 dias, lembrando os quarenta dias em jejum e provações pelas quais passou Jesus no deserto antes de iniciar seu ministério apostólico. Esse período recebeu o nome de quaresma.
No início da quaresma, na quarta feira, criou-se o costume de marcar a testa dos fiéis com uma cruz feita com cinzas de uma fogueira, em sinal de penitência. A partir daí, por quarenta dias os fiéis deveriam passar uma série de privações para que pudessem esquecer os prazeres da vida material, da carne, para elevar seu espírito ao seu deus. Até a páscoa, se absteriam de manter relações sexuais, de comer carne, algum jejum era reforçado e incentivado, além de uma seriedade e de uma sobriedade. Qualquer tipo de divertimento mundano, aqui, era proibido.
Portanto, um dia antes dessa quarta em que se marcavam a cinza na testa, a quarta de cinzas, criou-se o hábito de festejar e fazer tudo o que não seria permitido na quaresma. Esse dia de comilança, de brincadeiras e todo tipo de folguedo, o carnaval. Que em italiano, o “carne vale”, quer dizer o dia de adeus à carne”. Diversas tradições serão incorporadas a esse dia de adeus à carne, ao carnaval.
Como a igreja via o carnaval?
Apesar de não ter sido intencional a criação do carnaval, a igreja percebeu as vantagens da festa. Era uma forma de permitir, durante uma quantidade pequena de dias, um relaxamento das pressões diárias as quais os trabalhadores passavam. E, se aceitar essa festividade durante esses dias era uma forma de mostrar boa vontade com as tensões populares, também era uma forma de exigir comportamento exemplar em todos os outros. Era tolerado e, não oficialmente, incentivado até.
Como se calcula o dia do carnaval?
A terça de carnaval cai um dia antes ao início da quaresma. O primeiro dia da Quaresma é a quarta feira de cinzas. E isso varia de acordo com a páscoa. A quaresma dura 46 dias, sendo 40 dias e seis domingos.
Sendo assim, para se calcular os dias do carnaval é necessário saber a data da páscoa. E a data da páscoa varia de ano para ano, porque ela depende da data do equinócio de março, que para nós no Brasil é o equinócio de outono (ou primavera, se você estiver no hemisfério norte). O equinócio é um fenômeno astronômico que marca o fim de uma estação para a entrada na próxima. Nesse caso, marca o fim do verão e o início do outono. Ocorre dia 20 ou 21 de março, depende do ano.
Depois do equinócio, há que se identificar a lua cheia desse período. O primeiro domingo depois dessa lua cheia é o domingo de páscoa.
Ou seja, a páscoa é o domingo depois da lua cheia que vem depois do equinócio de outono, depois do equinócio de março.
Batalha entre o Carnaval e a Quaresma

Por volta do século XII, surgirá a história de uma batalha entre dois personagens que já tratamos aqui: O Carnaval, representado por um homem gordinho, fanfarrão, divertido e beberrão. E a Quaresma, portanto, é uma mulher muito magra, ossuda, muito rígida, séria, casta e severa. Enquanto o carnaval é representado visualmente pelos excessos da sua data, a quaresma é marcada pela imagem da escassez, da falta.
A priori a personagem da Quaresma é representada por um homem com essas características, posteriormente passa a ser retratada como mulher. O Carnaval também é tratado como Carnagem. Na maioria das vezes a Quaresma é tratada como velha, é ligada à solidão e à reflexão. Assim como o carnaval é ligado à juventude, à coragem, ao impulso, à vida comunitária, às brincadeiras.
Com o tempo, o carnaval passa a ser visto exclusivamente como a falta de medidas. E nessa “batalha”, toda vez a quaresma ganhava, que mostrava que uma vida de regras, concessões e sacrifícios era mais forte do que a folia e os excessos. No entanto, o carnaval sempre voltava, todos os anos, durante aqueles dias, o que era uma forma de estar sempre presente. E a batalha se reiniciava.
Caráter comunitário do carnaval
Um dos valores importantes do carnaval é o compartilhar, é ser essa data e essa festa que existe na coletividade. Na companhia. É a resistência da alegria mesmo em tempos dificeis. É uma forma de criar esperança para sobreviver a tempos difíceis. E é, antes de mais nada, a ligação com a nossa carne e aquilo que nos faz humanos. É onde mora a empatia, porque nos faz olhar para o outro não como um ser outro, mas a nós mesmos como parte de uma comunidade. Faz, desse modo, com que nos vejamos como parte do outro. De muitos outros. O carnaval é importante porque nos iguala em multidão.
Sendo assim, nos hermana.
Motivos pelos quais tratamos aqui o carnaval como data
Embora exista inspiração de elementos que reconhecemos como próprios do carnaval nessas festas da Antiguidade, é importante reforçar que cada uma dessas festas tinha seus propósitos específicos. E que não são iguais ao carnaval. Porque apesar de as origens do carnaval possuírem muitas diferentes referências, ele surge nesse formato e nessa data com um propósito específico.
O carnaval, especialmente no nosso país, já não se prende tanto ao rito da quaresma. Apenas em algumas vertentes religiosas existe o respeito a todas essas tradições. E o carnaval, com todas as suas transformações e histórias, tem algumas feições próprias aparte dessa história. Receberá a influência de diversas culturas.
No entanto, é importante deixar claro que, ainda assim, obedece a uma rígida estrutura de data e é incorporado às festividades da páscoa e de corpus christi todo ano. Ele não acontece de maneira independente, e foi estabelecido como feriado nacional graças a essas ligações. Então, sim, mesmo com todas as influências de outras etnias e uma história que veremos mais profundamente em seguida, participa da vida da cidade e se manteve no nosso calendário vinculada às tradições da páscoa.
Então… Sim, o carnaval é uma festa e uma tradição cristã. Muitas denominações não aceitam o carnaval, no entanto.
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